Olá amigos. Ontem, dia 5 de Outubro foi “dia do professor”. Actualmente todas as minorias ou espécies em extinção têm dias consignados no calendário.
Já fui aluno, professor, explicador. Posso mesmo dizer que construí a minha casa e a minha vida de adulto, ligado intrinsecamente ao ensino. A (ainda) minha mulher é professora e os meus filhos frequentam o ensino secundário.
Fui aluno num tempo em que se dizia que o ensino era fechado, dogmático e subserviente com o regime corporativista da altura. Era sim senhor. Obrigaram-me a cantar ao Sábado de manhã o hino nacional, o hino da mocidade portuguesa e o “Angola é nossa”. Era uma chatice. Principalmente porque cresci a pensar que Angola era mesmo nossa. Claro que não era, nunca foi e obviamente não será. Angola neste momento é dos carteis do petróleo e dos diamantes. Infelizmente nunca foi dos angolanos.
Todavia e pese embora todos estes rituais fascizantes, passei para a 2ª classe a saber ler e escrever, consegui no final da 4ª organizar geograficamente o globo na minha mente e tinha a noção de quem era, onde residia e do que existia no país onde nasci. Ensinaram-me a encarar com orgulho um passado maioritariamente glorioso e a respeitar um povo aventureiro e que foi dos poucos que deixou a sua marca na evolução histórica do Homem neste planeta. De homens que se fizeram ao mar correndo riscos que hoje nenhum cosmonauta corre. De um povo que aceitando o desafio do desconhecido, enfrentou outros povos, outras culturas, muitas vezes dando a morte como certa e somente exigindo o seu legitimo soldo. Aprendi de uma forma massificada a velha tabuada que sei na totalidade passados 41 anos e que me permite desenvolver operações lógicas e de cálculo sem recorrer a apetrechos colaterais. Consegui com esse tipo de ensino ter flexibilidade criativa (porque a aritmética é criadora) e não necessito que uma máquina registadora me diga quanto tenho a levar de troco. Mas acima de tudo, aprendi que à minha frente sempre se “impuseram” pessoas que sabiam, que me transmitiram valores morais e éticos importantes, que me ajudavam quando chorava ou me elogiavam quando era bem sucedido, que sempre transmitiram um mundo onde nem todos poderiam ser licenciados mas que ninguém impunha o trilho a seguir. Hoje, tenho amigos mecânicos e electricistas que, escolhendo livremente os seus destinos, tiram largamente um rendimento muito superior a muitos licenciados. São os verdadeiros técnicos, aqueles que na prática nos resolvem os problemas do quotidiano.
Tenho, como é óbvio, muitas críticas a fazer ao modelo de ensino em que vivi, em termos de liberdades e alguns direitos à diferença que não eram salvaguardados. Porém, não posso de modo algum criticar os professores dessa época. Pessoas integras em que o conhecimento brotava facilmente. Acima de tudo pessoas respeitadas. E aí vem a pedra de toque. O respeito.
O professor era um ícone na sociedade vigente. Alguém extremamente respeitado por alunos, pais, colegas e entidades ligadas ao ensino. Havia o culto do professor é certo e nem sempre correcto. Mas, que temos hoje? Um ensino que para além de não preparar o aluno para o seu futuro – embora o obrigue com 13 ou 14 anos a decidi-lo – não lhe fornecendo qualidade de ensino nem conhecimentos adequados ao exercício de qualquer profissão (excepto o vazamento de lixo e reciclagem do mesmo), deitou abaixo todo o sentimento de respeito que se tinha pela imagem do professor. Hoje, todos sabem tudo à excepção dos professores. Os alunos ofendem-nos diariamente, os pais dão como certo a sua incompetência e o Ministério da Educação ignora-os na totalidade. Muitas vezes me questiono de quem fui a culpa de todo este descalabro que nos coloca lado a lado com o Zimbabwe e o Ruanda nas estatísticas internacionais em termos de rendimento escolar. Só encontro uma resposta : dos professores.
Foram eles que logo após o 25 de Abril e numa tentativa desesperada e sem racionalidade para democratizar o ensino, se esqueceram que esta democratização teria de ter regras, limites e, acima de tudo, a manutenção do respeito pelos detentores do conhecimento neste sistema. Sanearam-se professores qualificados, posteriormente substituídos por alunos universitários e muitas vezes finalistas do secundário. No fundo, “abandalhou-se” todo o sistema de ensino e esse processo foi iniciado e consentido pelos professores. Hoje, tentam recuperar a imagem, reputação e respeito que um dia possuíram. Mas estão longe de o conseguir. O que destruíram em poucos meses levou anos a construir e levará muitos mais a reconstruir, se alguma vez o conseguirem.
Enquanto mantiverem um ensino que privilegie o conhecimento do rancho folclórico local em detrimento da localização dos Andes ou da resposta imediata de quanto são 7 vezes 8, não haverá respeito pelos professores e facilmente seremos ultrapassados por quem realmente sabe. Actualmente, a fundação da primeira universidade por D Diniz é um facto perfeitamente secundário, mas a noção de quem é e o que faz o senhor presidente da autarquia local é algo digno de registo, tal como a existência da disciplina de “estudo acompanhado”. Felizmente, os que hoje são pais e outrora foram alunos desse chamado ensino fechado, saberão dar um acompanhamento diferente ao seus filhos, de modo a que se possa mediar e complementar a irracionalidade que grassa nas escolas. Não necessitamos de dias dos professores. Acima de tudo, necessitamos somente de professores.
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