Ontem chorei.
Eu, que muito raramente choro, armei-me em piegas e chorei. Por vezes dá-nos estas coisas e se a vontade de verter algumas lágrimas é superior ao estado normal, não temos de as evitar.
A mãe dos meus filhos saiu de casa em Março deste ano, deixando-me no início com dois adolescentes e uma casa para gerir. Abracei o facto com a normalidade possível, mas posteriormente a minha filha, por solidariedade ou não, foi viver com ela. O meu filho também. Fiquei só. Fez-se um silêncio terrível nesta casa. Os passinhos e as brincadeiras de há 14 anos anos faziam eco todas as noites. Cruel o destino. Mais cuel ainda quando as expectativas de viver com quem ocupa o meu coração se desvaneciam como poeira na consentida burocracia judicial e na estabilidade confortável de uma situação mantida há muito.
Este fim-de-semana os meu filhos estiveram comigo. Fui com eles ao cinema e na hora de dormir alguém entrou no meu quarto e disse que tinha frio. Nunca uma baixa temperatura foi tão abençoada nesta casa. Sorri e fui buscar o velho edredon de penas para colocar na cama da minha filha. Aconcheguei-a e falámos um pouco como antigamente. Depois de sentir que estava confortável e sem o frio que a solidão nos transmite, dei-lhe um beijo de boas noites. O meu coração derreteu-se com a imagem e a volta de um sentimento perdido há tanto. Abracei-a e apaguei a luz. "Até amanhã, fifinha". Um até amanhã que gostaria que se prolongasse por mais, muitos mais dias, lembrando quem sabe os tempos em que sua mãe ainda detinha algum equilíbrio mental e esta casa era tal como o edredon, a magia do acolhimento. Mas esses tempos passaram. Entre um edredon que se foi e outro que teima a recusar tapar o frio da minha solidão, restou este beijo de boas noites, terno e profundo.
Depois chorei. Como há muito não o fazia.
Jose Carlos Lucas
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