segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Desde o início dos tempos o Homem procurou a perfeição e a verdade. Não sendo esse o seu objectivo pragmático, era a epiderme da sua essência psicológica, a busca incessante do seu ser.

Até há pouco tempo atrás, digamos, dois séculos, só uma pequena minoria dos seres humanos se preocupava com esses obscuros assuntos do Ser e a ele se dedicava com profundidade e muitas vezes obsessão. Após a Revolução Industrial o mundo mudou. As comunicações tornaram-se mais rápidas, a população cresceu em progressão geométrica e instalou-se um sentimento de renovação nas mentes. Finalmente tudo aquilo com que se sonhava era possível como mais ou menos esforço ser concretizado. Foi com esta certeza inabalável que se entrou no século XX. Foi com a mesma certeza e a mesma convicção que não se evitaram as duas mais sangrentas guerras dos tempos modernos e que finalmente se descobriu que a reacção em cadeia dos átomos de elementos pouco reagentes, poderia dar ao planeta um fim mais ou menos rápido consoante as condições posteriores à guerra nuclear. O Homem, que nunca até hoje descobriu como veio aqui parar, ou pelo menos ainda discute teorias sobre esse assunto, fácil e rapidamente obteve uma resposta para o seu fim. Pior. Se o seu início pode não ter afectado tudo o que o rodeava, o fim não será só o seu, como também o da generalidade dos seres vivos deste planeta. Quando muito, ficariam as baratas para contar. A sua dose de quitina poderia fazer com que sobrevivessem ao holocausto, tal como sobreviveram a tanto até ao presente. Esta é a verdade.

A perfeição é outra matéria.

No pós 2ª Guerra Mundial e com a renovação de um largo espaço do globo destruído – nomeadamente a Europa – sentiu-se como há muito tempo não acontecia, uma lufada de ar fresco. Os cinzentos da primeira metade do século deram lugar ao colorido dos tecidos com Lucciano Benetton. A juventude que até ali não colocava entraves à passagem do saber entre gerações, questionou finalmente o porquê das coisas e os anos 60 deram ao planeta uma razão de viver finalmente em paz. Pese embora a introdução drogas no seio da comunidade jovem por parte do sistema e dos governos vigentes no sentido de denegrir a imagem de uma evolução histórica, os sobreviventes conseguiram passar ainda a mensagem que a paz e o entendimento são possíveis.

Ah a perfeição. É verdade. A perfeição é um fenómeno tipicamente lusitano. Nós, os descendentes de Afonso Henriques (o primeiro ser perfeito) somos perfeitos em tudo o que fazemos. Deram-nos uns livros de marketing na escola em que a excelência seria algo a procurar e a colocar em prática. E, carneiros, deixámos de pensar pelas nossas cabeças passando a fazê-lo pelos autores dos citados livros. Hoje em Portugal, o Estado tenta garantir a perfeição do sistema (enviando pensões a pessoas já falecidas), os professores garantem que o sistema educativo é um mimo (evitando expulsar alunos delinquentes por simples medo), os engenheiros orgulham-se das obras feitas (que se prolongam pelo dobro do tempo calculado), os médicos são o supra sumo da barbatana e não se questiona as suas decisões (os mortos não falam e o juramento de Hipócrates é sempre giro e tão só), os profissionais de comunicação e publicitários não questionam as suas peças porque têm sempre razão e além disso são perfeitas (milhões perdidos em vendas), os psicólogos detestam os psiquiatras porque não há que ir tão longe, tal a sua competência (não conseguem sintomas depressivos após várias consultas provocando o absentismo e o sofrimento de uma percentagem crescente da população) e … enfim, os outros têm sempre razão, porque são perfeitos.

Como resultado, continuamos em último na produtividade da União Europeia, somos uns dos que mais trabalha (ou passa mais horas no trabalho o que é diferente), temos os piores transportes, o menor salário (mas vamos todos os dias de carro para o trabalho) e conseguimos ser apurados para a fase final do Euro 2008. Perfeito. Há razões que a razão desconhece.

José Carlos Lucas

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